O sinal distintivo
do homem de diálogo
é que escuta
tão bem como fala
ou, talvez melhor.
Jean Lacroix
Escutar, mais do que falar, é o segredo das boas relações humanas. O ouvinte atento e interessado cativa os outros, na medida em que lhes dá a importância que eles desejam. Deste modo, abre o caminho para ser também ouvido e respeitado.
A arte de escutar não se resume ao ato externo de ouvir. Exige disponibilidade, interesse pelos outros, interpretação correta das palavras, observação da linguagem corporal, espírito crítico e prudência nos conselhos.
Disponibilidade
Escutar implica paciência, calma e serenidade. Quem fala tem o direito de escolher o assunto de conversa expressar-se espontaneamente, com a sua linguagem, os seus silêncios e as suas divagações.
Compete a quem escuta oferecer disponibilidade e não ter pressa de despachar a pessoa, como quem despacha um recado. Particularmente simpático é dizer a uma pessoa: «Estou aqui para o ouvir; tenho tempo para si...».
A disponibilidade máxima é manter-se calado quando só apetece falar. É ser capaz de ouvir até ao fim, sem interromper as pessoas, mesmo que elas sejam pouco simpáticas ou nos desagradem os temas de conversa. É ser capaz de manter autodomínio, mesmo perante palavras injustas ou ofensivas.
Escutar até ao fim é não só um sinal de delicadeza, mas também uma estratégia que torna os outros mais calmos e mais recetivos às nossas mensagens. Em geral, as pessoas ficam, muito aptas a escutar depois de satisfeita a sua necessidade de falar.
Claro que a disponibilidade tem limites. Quando o ouvinte está na presença de pessoas maçadoras, deve saber pôr fim à conversa. Antes que a sua paciência se esgote, o ouvinte deve dar um sinal claro de que já entendeu o essencial e «defender-se» com a necessidade de prestar atenção a outras pessoas ou de resolver algum assunto importante.
Escutar é um ato generoso. Ninguém tem o direito de o transformar em tortura psicológica.
Interesse pelos outros
Mostrar interesse significa, antes de mais, olhar de frente para a pessoa, enquanto escuta. Olhar de frente, «olhos nos olhos», é um processo eficaz para evitar as distrações, captar a linguagem corporal e estabelecer uma relação mais profunda.
Escutar não significa passividade. Pelo contrário. Um gesto, um aceno de cabeça, uma pequena intervenção ou uma pergunta simpática manifestam o interesse do ouvinte e podem estimular o outro a falar.
Todas as pessoas sentem necessidade de alguém que as oiça. Apreciam a oportunidade de falar de si, das suas motivações, dos seus problemas. Só por essa razão, algumas procuram o médico, o psicólogo, o psicanalista, o confessor ou então desabafam nos novos «confessionários» da cidade (táxis, bares, cabeleireiros...). Em circunstâncias excecionais, sobretudo nas grandes cidades, há pessoas que se recorrem dos «telefones da amizade» para encontrar alguém que lhes preste um pouco de atenção.
As pessoas preferem sempre falar de si a ouvir-nos falar de nós. Deste modo, um dos segredos para conquistar as pessoas é incentivá-las a falar de si mesmas ou de assuntos da sua preferência (filhos, família, sucessos pessoais, projetos de futuro...) e dispor-se a ouvi-las com atenção. Aí as pessoas ganham entusiasmo. E sentem-se de tal modo fascinadas pela amabilidade de um bom ouvinte que, muitas vezes, agradecem dizendo: «Gostei imenso de falar consigo; você é um ótimo conversador...» Isto apesar de o ouvinte ter estado calado quase todo tempo.
Interpretação correta das palavras
A linguagem das palavras é equívoca e até traiçoeira. A mesma palavra tem por vezes significados distintos na boca das pessoas diferentes. Assim, pode acontecer que uma pessoa diga uma coisa e o ouvinte perceba outra.
Para garantir a interpretação correta das palavras, o ouvinte deve perguntar-se. «Compreendi exatamente o que foi dito?»
Uma técnica muito simples ajuda a clarificar ou a confirmar a compreensão de uma mensagem. É a técnica da reformulação que consiste em resumir, por palavras próprias, de forma clara e breve, as ideias emitidas pelo interlocutor: «Foi isto que me quis dizer?» No caso de persistirem dúvidas, o melhor será pedir à pessoa que esclareça o sentido da sua mensagem. A reformulação é um sinal de estima e apreço pelos outros, na medida em que pomos cuidado na interpretação das suas palavras. Mas o objetivo essencial da reformulação é garantir que há comunicação sem distorções.
Manda a honestidade que não se interpretem apressadamente as mensagens alheias. Nem sempre é fácil captar o essencial da verdade que a outra pessoa transmite. E, havendo má interpretação espreita o desentendimento.
Observação da linguagem corporal
A linguagem das palavras (linguagem verbal) é pobre. Nunca exprime, com exatidão, as ideias. Muito menos, os sentimentos.
Na comunicação face a face, a pessoa revela as suas motivações mais profundas numa linguagem diferente. É a linguagem não-verbal, ou linguagem do corpo, que vem completar a linguagem falada, enriquecendo, assim, a comunicação interpessoal.
O modo de falar, as posições corporais, o movimento das mãos, os gestos, o olhar, a voz (calma, apressada, deprimida, exaltada), as lágrimas, o riso, a respiração e os silêncios manifestam mais do que as simples palavras. Basta um tom irónico ou uma voz irritada para dar um significado diferente ao que se diz. Por exemplo, a simples expressão «está bem» pode significar aprovação, crítica, dúvida ou resignação, conforme o tom em que for pronunciada.
As expressões do rosto transmitem mensagens espontâneas, naturais, que indicam o que a palavra não consegue dizer ou se esforça por esconder. Revelam inferioridade ou superioridade, alegria ou tristeza, confiança ou insegurança, interesse ou impaciência, delicadeza ou agressividade.
É impossível não comunicar. É difícil esconder segredos. Qualquer pessoa, mesmo em silêncio, comunica com o corpo, sobretudo com as mãos e com o rosto. E o corpo não mente.
Compreende mais e melhor aquele que domina o significado das expressões do rosto, sobretudo do olhar:
- um olhar baço e mortiço significa frustração ou tristeza;
- um olhar frio e severo significa desprezo ou agressividade;
- um olhar vivo e brilhante significa alegria ou entusiasmo;
- um olhar suave e caloroso significa confiança ou prazer.
Podemos ler nos olhos dos outros, pois os olhos são o espelho dos sentimentos. Por isso mesmo é que algumas pessoas , não querendo mostra-se, escondem o olhar.
Espírito crítico
Na comunicação humana, a objetividade pura não existe. Ainda que as pessoas procurem ser objetivas, elas acabam sempre por misturar factos, opiniões e desejos. Omitem, deformam ou exageram a realidade, consoante os seus interesses. Tendem a ajeitar a verdade às suas conveniências.
Avisado quanto aos perigos da subjetividade na comunicação, o bom ouvinte procura escutar até ao fim, mas não se deixa levar na corrente das palavras. Esforça-se por avaliar as mensagens alheias, distinguindo as palavras das intenções. Ele sabe que, muitas vezes as pessoas dizem uma coisa e querem dizer outra, ou pior ainda, muitas vezes não dizem o que pensam.
Perante a expressão de sentimentos e emoções, o bom ouvinte oferece compreensão e apoio. Perante a expressão de ideias, ele mostra espírito crítico. Confronta aquilo que escuta com aquilo que pensa e sabe. Não se precipita a aceitar ou a rejeitar, a aprovar ou a censurar. E, sem ingenuidade nem desconfiança, dispõe-se a dialogar.
Prudência nos conselhos
As pessoas que falam de si próprias não procuram conselheiros. Preferem ouvintes discretos, capazes de compreender, apoiar e guardar uma confidência.
Mas, por vezes, o ouvinte é solicitado a dar opiniões e conselhos. Que fazer então? Se a matéria for da sua competência, o ouvinte deve dar orientações. Os conselhos são oportunos, na medida em que são verdadeiramente desejados e competentes. Porém, se a matéria não for da sua competência, o ouvinte deverá usar de prudência. Só assim evitará ser responsabilizado por eventuais fracassos.
Em assuntos da vida particular, convém ser ainda mais cauteloso. Pode-se ajudar, mas não se deve substituir os outros. Um adulto tem de encontrar as próprias soluções e assumir as suas responsabilidades.
Todos gostamos de dar conselhos. Com isso sentimo-nos úteis e importantes. Mas é de bom senso não entrar em assuntos que não são da nossa competência, «não meter a foice em seara alheia». Quem não é médico não receita medicamentos!
Jorge Neves
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