As propostas e as ideias para que se caminhe para uma melhor distribuição da riqueza, todas elas assentam numa condição comum que ainda hoje não é uma realidade: a existência de governos capazes de agir e de enfrentar, com tais reformas, a nova Internacional do dinheiro sem por isso sofrerem a sanção da fuga de capitais. A única nação que pode hoje provocar uma mudança de rumo, contando apenas com as suas próprias forças, é a superpotência económica e militar dos Estados Unidos. Mas, no momento actual, as hipóteses de se ver os norte-americanos lançar uma iniciativa para refrear as forças do mercado em proveito de todos os povos são praticamente nulas. Pelo contrário, o mais provável é que os futuros governos dos Estados Unidos apontem para soluções (aparentes) de tipo proteccionista e procurem obter para o seu país vantagens comerciais à custa das outras nações.
Aliás, tal não estaria em contradição com a tradição norte-americana. Aquela América cheia de abnegação, que ajuda o resto do mundo a resolver os seus problemas, nunca existiu. Os governos norte-americanos, qualquer que seja a sua cor, conformam-se quase exclusivamente, e desde sempre, ao que consideram ser o seu interesse nacional. Enquanto foi necessário combater o «Império de Mal», a Leste, era preciso uma Europa Ocidental estável e próspera, para se opor ao comunismo o suave rosto do capitalismo. Neste momento, porém, Washington já não necessita da Europa para desempenhar esse papel. Se as empresas instaladas nos Estados Unidos puderem retirar vantagens de uma política que afaste os produtos e as prestações de serviços estrangeiros do mercado norte-americano ou de outros mercados importantes, certamente não hesitarão em dar o seu apoio político às forças do mercado. Recordemos durante a administração Clinton já nos deu um ante gosto dos futuros conflitos transatlânticos durante a crise do dólar de 1995. Recorde-se também que já em Agosto de 1996, segui-se-lhe outro exemplo. A pretexto da luta contra o terrorismo, o presidente do Estados Unidos assinou uma lei que pretende banir do mercado norte-americano todas as empresas europeias e japonesas que têm negócios com o Líbano e o Irão, nomeadamente nos sectores petrolífero e da construção. Os Estados membros da União Europeia viram-se obrigados a agitar a ameaça de represálias. É exactamente porque o Estado social norte-americano está arruinado e já não consegue proteger os seus cidadãos contra as crises provocadas pelo mercado mundial que a grande reacção contra a mundialização há-de certamente vir do país que propagou no mundo inteiro o dogma da submissão total ao mercado. O gigante norte-americano não é somente imprevisível no seu papel de polícia do mundo. Deixou igualmente de manter o seu papel de guardião do comércio livre mundial.
JORGE NEVES
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