Há alguns anos atrás, conheci o Pedro, cuja a história de vida nunca mais consegui esquecer. Dez anos antes do nosso primeiro contacto, o Pedro, acordou num hospital após um acidente de automóvel e soube que o irmão tinha morrido. Três dias depois, a polícia acusou-o de ter causado o acidente. Era ele que ia a conduzir, mas não se lembrava de nada acerca da viagem ou do acidente. Passou os dez anos seguintes sentindo-se culpado, colocando-se todos os dias em julgamento pelo assassínio do irmão.
Consequência do nosso trabalho em várias reuniões profissionais, Pedro confessou-me que tinha desperdiçado energia durante dez anos, ao manter-se numa prisão de auto-recriminação .Começou a perceber que nem ele nem a sua família, nem o seu trabalho, nem os seus amigos tinham beneficiado dessa situação. Depois de ter começado a aceitar as consequências do seu comportamento - negativismo, infelicidade e nada para dar aqueles que amava - nessa conversa, fechamos a porta e Pedro desatou a chorar. Chorou muito, deixando sair tudo aquilo que tinha mantido dentro de si até àquele momento. Era de partir o coração vê-lo a partilhar a sua dor. Naquela altura, decidiu verbalizar os seus sentimentos, expressando-os numa carta. Também decidiu visitar familiares com mais frequência, para poder partilhar a sua dor e a sua angústia com eles.
Pedro escolheu confrontar as suas emoções e fazer tudo o que podia para analisá-las. Precisava de aliviar a culpa para poder ter mais para dar aos irmãos, mulher, amigos e emprego. Precisava sentir, de escrever e de falar, para se livrar da dor e poder dar algo de positivo a si e aos outros. Sentir-se culpado é, muitas vezes, considerado um sentimento nobre, talvez porque o confundimos com assumir a responsabilidade pelas nossas acções. Até termos trabalhado a nossa culpa e nos termos reconciliado com os nossos valores, temos pouco para dar ao resto do mundo. Isto foi o que Pedro finalmente compreendeu.
Se magoar ou matar alguém, é culpado? Para tentar responder a esta ou a qualquer questão semelhante, retomemos a ideia de que cada um de nós tem a responsabilidade pela sua vida. Se magoa outra pessoa intencionalmente, então tem de assumir a responsabilidade por essa acção. Mesmo que estivesse enlouquecido no momento, cometeu um crime.
Apesar de desespero que Pedro vivia, instintivamente a partir daquele momento tinha de encontrar uma forma de se perdoar. Começou a encarar que o que tinha feito e de reconhecer que nunca poderia ser desfeito, mas ao mesmo tempo, também precisava de olhar para o jovem assustado e frustrado que se tinha feito. Encontrou uma forma de se confortar e perdoar, porque não havia mais ninguém para o fazer. Conseguiu dizer a ele próprio que tinha feito uma coisa terrível, mas sem intenção. Se tivesse continuado a recriminar-se e a encarar-se como uma espécie de monstro, teria ficado prisioneiro num labirinto de culpa e de censura, e mantendo o risco de repetir o que tinha feito.
Ficar livre da culpa não significa recusar assumir a responsabilidade pelas nossas acções. Pelo contrário, implica reconhecer a responsabilidade a analisar cuidadosamente os nossos sentimentos de culpa, para alcançarmos a compreensão e o perdão.
Perdoarmo-nos quebra o círculo vicioso, no qual a violência e o ódio por nós alimentam mais violência e ódio. Precisamos de aceitar a responsabilidade de sentir a nossa culpa, para podermos reviver e depois perdoarmos. Se chegamos à conclusão que o que fizemos foi errado, mas trabalharmos para nos perdoarmos, temos mais para dar, incluindo mais compaixão e empatia para com os outros.
Para sentirmos compaixão pelo mundo, precisamos primeiro de sentir compaixão para nós próprios.
Jorge Neves
Toda a gente gosta de elogios; eu não sou excepção. Já fui dependente de elogios, absolutamente dependente de aprovação. Mesmo quando recebia elogios, sentia que chegavam demasiado tarde e não eram exactamente o que pretendia. Acreditava que o elogio me daria a autoconfiança que me faltava. Foi muito difícil curar-me desta necessidade, mas compreendi que a aprovação que procurava nos outros era um substituto pobre para a confiança na minha opinião.
Porque procuramos substitutos para a nossa sabedoria interior? Colocado de uma maneira simples, parece haver duas formas de viver a vida: confiar na sua voz interior ou depender do mundo exterior e das suas opiniões sobre si.
Todos vivemos uma combinação dos dois mas, quando aproveitamos a nossa Inteligência Emocional, vivemos de dentro para fora. Quando não o fazemos, vivemos de fora para dentro. Quando sentimos um vazio e falta de calma interior e de autoconfiança, os elogios externos podem levantar o nosso estado de espírito. Mas, concentrarmo-nos de mais neles diminui as hipóteses de descobrirmos as nossas verdadeiras qualidades e de termos a nossa voz interior a conduzir a nossa vida.
A história do Manuel, um amigo meu, é o bom exemplo disso.
Manuel era o líder de uma empresa de média dimensão que a geria de forma autónoma em relação à empresa-mãe. Estava a passar por tempos difíceis e estava a ponderar o despedimento de 20 colaboradores para poder conseguir sobreviver. Durante mais de um ano, Manuel lutou por um grande contrato que Alexandre, o director geral da empresa-mãe, estava convencido que não iria conseguir fechar. Mas Manuel nunca desistiu e consegui o contrato. Estava a rebentar de orgulho quando foi ao escritório de Alexandre partilhar as novidades.
Sendo um homem de poucas palavras, Alexandre não tinha o hábito de distribuir elogios. A sua reacção à notícia de Manuel foi um simples "Óptimo". Manuel tinha sonhado com este momento durante muito tempo, imaginando que o seu chefe iria elogiá-lo com uma expressão do tipo: " Parabéns! Salvou a sua filial" Não consigo agradecer-lhe o suficiente!". Mas Alexandre não disse isso. Talvez devesse ter dito, mas não serve de nada concentrarmo-nos no "devia" - temos simplesmente de aceitar o que Alexandre disse.
Esse amigo meu o Manuel, viveu consumido pela zanga que sentia em relação à falta de reconhecimento por parte do seu chefe e transportava diariamente essa hostilidade. Isso estava a afectar o seu trabalho e a sua vida pessoal de uma forma evidente. Contou-me ele que finalmente a mulher explodiu: "Enfrenta a tua ira e acaba com ela - já não aguento mais ouvir isto!"
Todos sabemos como é fácil cair neste tipo de armadilha. Todos gostaríamos de transformar os nossos chefes naquilo que pensamos que "deviam" ser.
Na melhor das hipóteses, podemos influenciar os outros até certo ponto, mas não podemos realmente mudá-los.
Ao longo dos contactos que vim fazendo com o Manuel ele consegui quebrar o círculo da zanga e da recriminação silenciosa. Em vez de se concentrar na sua angústia e tristeza em relação à atitude de Alexandre, consegui focalizar-se no seu orgulho e na sua satisfação. Afinal, tinha alcançado algo importante. Por fim, aprovação de Manuel por si próprio passou a ser o suficiente. Só depois de lidar com a sua dor é que consegui aceitar os seus próprios elogios por ter conseguido o contrato.
Quando acreditamos em nós e no nosso julgamento, podemos encontrar paz, mesmo que os outros não consigam expressar a sua aprovação. A nossa voz interior é muito mais poderosa do que qualquer outra que recebamos do mundo exterior.
Há riscos associados à procura contínua de aprovação e à dependência de elogios, mas não há riscos envolvidos ao se fazerem elogios. Somos todos humanos e, mesmo para aqueles que conhecem e alimentam a voz interior, um elogio nunca faz mal.
Quando um trabalho é bem feito, a apreciação é bem-vinda e encoraja o bom desempenho. Demasiados chefes mostram-se relutantes e sovinas em fazer elogios aos seu colaboradores. Afinal, nem mesmo esses mesmos chefes são imunes a um elogio.
Jorge Neves
Muitos psicólogos acreditam que os sentimentos difíceis e dolorosos têm origem na infância. Alguns expressam-no da seguinte forma: primeiro fomos magoados e, como não conseguimos transmitir a nossa dor por palavras, ela transforma-se em zanga; e como não tinha-mos uma saída para a zanga, esta transforma-se em angústia.
Todos temos arranhões e cicatrizes da infância. Isso não significa que os nossos pais ou outros nos quisessem magoar, mas sim que os seres humanos nem sempre são capazes de amar incondicionalmente. Não conseguindo compreender isso, as crianças sentem apenas a dor associada à perda de amor. Alguns psicólogos acreditam que esta dor é escolha nossa e que na sua base está a falta de amor.
Existem muitas teorias sobre o assunto. Curiosamente, muitos especialistas não estão de acordo. Prefiro acreditar que eu e você tivemos muito amor quando nascemos - a abordagem mais construtiva à questão dado que ninguém sabe realmente a verdade.
A Bíblia diz que somos feitos à imagem de Deus. Está também escrito que Deus é amor. Da forma como vejo as coisas, o bebé-nascido é o fruto e a expressão do amor, que depois enfrenta o desafio de viver com a mãe e o pai.
Em tempos, não tinha consciência de quanto os nossos pais influenciam a nossa vida. Muitos participantes em sessões de formação de vendas em que participei obtêm conhecimentos valiosos e inesperados quando começam a analisar a forma como os nossos pais e outras pessoas dominam efectivamente a forma como pensamos enquanto jovens - e continuam a fazê-lo mesmo quando somos adultos.
É impossível encontrarmos paz de espírito ou felicidade completa enquanto continuarmos ressentidos com os nossos pais. O ressentimento continua a controlar as nossas vidas se não nos libertarmos activamente dele. Não podemos libertar-nos dos nossos pais culpando-os ou continuando magoados. A ideia de que temos a tendência para não gostarmos daqueles com quem mais nos parecemos é especialmente verdade no caso das figuras paternas e maternas. Se continuarmos a julgá-los, negamos a nós próprios o conhecimento das nossas semelhanças com eles, especialmente nas questões em que mais os criticamos.
Há alguns anos, acreditava-se amplamente que 40 por cento da população tinha questões por resolver com os pais. Pela minha experiência, acredito que ronda os 90 por cento.
Quando alguém aparecia angustiado em reuniões de vendas a que presidi, uma das minhas primeiras perguntas é se estava zangado com um dos pais. Claro que me sentia à vontade para poder fazer esta pergunta.
Raramente me enganava nesta abordagem. As respostas revelavam muita auto-desilusão.
"Aceitei desde muito cedo o facto de os meus pais terem sido como eram e não fazia sentido ter tentado mudá-los. Como tal sinto-me à vontade com a situação." assim, eram muitos os desabafos. Tal racionalização e negação caracterizava muitas relações pais-filhos. Em última análise, uma ligação tão prolongada com os pais pode ser um grande entrave ao crescimento pessoal do indivíduo.
Outro mecanismo de confronto pode ser o elogio efusivo dos pais. A Elisa de 35 anos, contou-me que ainda vivia em casa dos pais devido ao facto de eles serem "fantásticos". Não aprofundei este assunto no primeiro dia - toda a gente tem direito àquilo em que acredita - e os seus pais podia ser pessoas excelentes. O que era óbvio, é que Elisa não estava "liberta" dos seus pais.
"Odeio-os"! À minha mãe e o meu pai". Odeio-os! Este é o lado oposto.
Esta história soa-lhe familiar? Ensinaram-nos que as nossa vidas serão boas e felizes se honrarmos a nossa mãe e o nosso pai. Acredito, contudo que, para sermos coerentes com este conceito, primeiro temos de reconhecer os nossos verdadeiros sentimentos e eliminar qualquer zanga ou ressentimento que permaneça. É a atitude emocionalmente inteligente a tomar.
Muitas pessoas têm receio de abandonar o ressentimento em relação aos pais, apesar de saberem que não irão alcançar uma vida melhor se não se libertarem desses sentimentos. Sempre que se sentir bloqueado, furioso ou magoado, trabalhe esses sentimentos, reconheça-os e analise-os profundamente. Tente perceber onde estão no seu corpo. O que sente? Que outros sentimentos estão escondidos por detrás dos sentimentos iniciais? O que lhe dizem? Seja paciente consigo - está a trabalhar com uma ferramenta importante, que irá ajudá-lo a aceder à sua inteligência emocional.
Em adulto, quando somos magoados ou negligenciados, podemos transmitir os nossos sentimentos por palavras. Em criança, quando uma ferida nos foi originalmente infligida,não fomos capazes de o fazer. Além disso, continuamos a ser magoados quando alguém coloca "sal" nessa primeira ferida. Algumas pessoas até defendem que não podemos sentir dor em adultos, a não ser que tenhamos sido feridos de uma forma semelhante na infância. Seja qual for a origem das nossa feridas, ao senti-las e reconhecê-las somos capazes de as curar. Com o tempo, as nossas feridas emocionais podem ser completamente saradas. A zanga incontrolável que por vezes surge quando tocamos numa ferida antiga mostra-nos que estamos a aproximar-nos da origem do problema. Os nossos sentimentos são sempre inteligentes: dizem-nos o que se está a passar e é sensato aceitá-los. O que fazemos no calor da emoção, muitas vezes não é assim tão inteligente; mas é inteligente ter em atenção as mensagens que os nossos sentimentos nos transmitem. A zanga dá-nos boas pistas para resolver conflitos emocionais. Pode ser uma forma de encontrar-mos a essência das nossas feridas, senti-las completamente, compreende-las e, por fim, sermos capazes de as limpar e curar.
Quando revelamos e partilhamos as nossas marcas dolorosas com os outros, as relações pessoais desenvolvem-se e melhoram, o que nos permite ver-nos uns aos outros de uma forma mais transparente. É vital reconhecer completamente as nossas feridas, sem protecção, para podermos descrevê-las a nós e aos outros. Isto ajudará a curar as nossas almas. Se negligenciarmos entrar em contacto com todos os sentimentos associados a uma ferida e não revivermos o incidente original, então a ferida poderá nunca desaparecer. Sentir-se ferido é ter uma marca escondida , sensível, que pode ser estimulada. Todos temos uma memória emocional.
Se o nosso chefe falar connosco de uma forma que é semelhante à do nosso pai e se a tivermos vivido como dolorosa na infância, sentimos novamente a mesma dor. Quando confrontamos a nossa vulnerabilidade, ficamos mais fortes. Se enfrentarmos a dor e não nos libertarmos a circundá-la, seremos seres humanos mais preenchidos.
Sei que uma das primeiras fases na orientação de líderes é definir que tipo de feridas se atravessam no seu caminho. Descobre-se sempre algumas e os líderes com quem trabalhei tornaram-se melhores quando neutralizaram os seus "pontos quentes". O passo seguinte é prestar diariamente atenção ao que sente, de modo a gerir as emoções à medida que elas surgem. Estar consciente das suas emoções é o ponto de partida, depois senti-las, a seguir deixá-las dizer-lhe o que têm a dizer. Aprenda a ouvir-se e a encarar com seriedade os seus sinais e os dos outros. Esta é uma ferramenta de liderança pessoal que todos precisamos de desenvolver, isto é, utilizar a sua Inteligência Emocional.
É reconfortante partilhar os nossos pensamentos e sentimentos com aqueles que amamos e respeitamos. Fazê-lo cura feridas e alivia a dor. Se está com problemas, não hesite em pedir ajuda a alguém de quem gosta que escute os seus sentimentos mais profundos. Diga-lhe que precisa que esteja ali e que o ouça. Diga-lhe que não espera nenhum conselho. Muitas vezes, é mais do que suficiente que o seu amigo apenas o ouça.
Jorge Neves